terça-feira, 17 de março de 2015

Esquerda, volver. Quem dera !

Não é que já tem gente do campo da esquerda democrática dourando a pílula das manifestações do último domingo ? Na minha visão, é um grave equívoco dizer que os atos reuniram gente de todas as classes. Isso não é verdade. Conta-se nos dedos o número de pobres nestas marchas fascistas, integradas na sua quase totalidade pelas classes média e alta. Também em nada contribui para a leitura correta do dia 15 acreditar que aquelas pessoas estavam ali para protestar contra a corrupção, conforme a pesquisa do Datafolha detectou. A corrupção está para a mobilização de domingo assim como o passe livre esteve para 2013,ou seja, é um mero pretexto. Puro embuste.

Se fossem militantes sinceros da causa anticorrupção, estariam defendendo a reforma política e o fim do financiamento privado. Parte expressiva dos que estiveram na Avenida Paulista berra contra a corrupção, mas dá propina para a PM, quando flagrada em infração de trânsito, e não hesita em sonegar impostos. Dispensemos, por favor, bobagens do tipo "uma minoria pediu intervenção militar", ou "alguns usam palavrões em seus cartazes e gritos de guerra contra a presidenta Dilma, Lula e o PT ", ou ainda "um número pequeno de extremistas pregou o assassinato da presidenta e de Lula e deram demonstrações de intolerância e violência." Chega de tergiversações : minoria é uma ova.

Confesso que não esperava viver para ver tantos brasileiros abastados abraçarem sem cerimônia a teses mais antidemocráticas, intolerantes, preconceituosas, violentas e fascistas. O que assistimos é um movimento de massas da direita como não se via no Brasil desde 1964, quando a expressão máxima da mobilização dos reacionários foi a marcha com Deus pela Família. As pessoas que estão nas ruas destilam o ódio disseminado pela mídia e não têm quaisquer compromissos com a ordem democrática. Não respeitam o resultado das eleições e se lixam para a soberania popular. É gente com claro déficit de conhecimento da história do Brasil. Analfabetos políticos e ignorantes, merecem como diz um amigo, uma surra de livro, isto sim.

Eles são brancos e nunca passaram privações. São portanto, minoritários, na sociedade brasileira. Mas dão a impressão de que são gigantescos, uma vez que estão mobilizados e com a faca entre os dentes. Sem falar no apoio incondicional e decidido do monopólio midiático. Enquanto isso, a maioria da população ( pobres e classe média baixa) se divide entre os que estão perplexos, os que foram contaminados pela febre golpista dos conservadores, os que se dizem decepcionados com Dilma  e desanimados e os que ainda topam defender suas conquistas nos últimos 12 anos.

Em vez de enxugar gelo com platitudes como "acatamos com humildade o recado das ruas" ou "isso faz parte da democracia", o governo deve correr para se repactuar com sua base social, sinalizando com medidas concretas. O nosso governo deve ser o único no mundo em todos os tempos que insiste em afrontar quem tem coragem de ir para as ruas em sua defesa, como a CUT, o MST e a UNE. E isso num momento de crise de extrema gravidade. De domingo para cá, parece inacreditável, mas uma das poucas respostas que o governo deu às manifestações foi dobrar a aposta na aprovação do ajuste fiscal pelo Congresso Nacional. Justamente o ajuste abominado pelos seus aliados.

Sinalização concreta para o povo significa dar uma guinada à esquerda, com algumas medidas objetivas :

1) Acatar as sugestões de mudanças feitas pelas centrais sindicais nas MPs 664 e 665, que dificultam o acesso a direitos previdenciários. Se preciso, retirar as MPs.

2) Mudar o ministério, mandando embora o Levy e a Kátia Abreu, e levando para o coração da articulação política palaciana o Jaques Vagner, por exemplo.

3) Falar todos os dias em reforma política, explicando para a população porque o financiamento privado das campanhas está por trás de quase todos os esquemas de corrupção.

4) Discutir com a sociedade e, finalmente, mandar para o Congresso um projeto de regulação econômica da mídia.

5) Incluir entre as prioridades do governo uma luta de apelo popular, tipo a implantação gradual da tarifa zero dos transportes em todos os municípios. É um assunto que cabe ao Executivo municipal ? É evidente, mas o governo federal pode desempenhar um importante papel indutor nessa questão.

Alimento poucas esperanças, porém, de que o governo tenha coragem política para operar essa mudança de rota. Vamos torcer e pressionar. Mas está feia a coisa.



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